quinta-feira, 15 de março de 2012

Professor César Ades

César Ades era um dos maiores especialistas do Brasil em comportamento animal (Foto: Reprodução/CNPq) 


Aos familiares, meus sentimentos; aos alunos e colegas, que continuem seu trabalho e aos animais, lamento a perda do seu  maior tradutor. Ficamos todos órfãos hoje.
Além do absurdo da situação, da falta de educação e das estatísticas da violência e morte no trânsito, a maior tristeza é saber que o querido professor Ades será um número a mais nessa contagem cruel, juntando-se ao imenso exército de mortos por criminosos impunes ao volante.
Convivi o último ano especialmente com os estudos que compuseram um trabalho acadêmico que envolve comportamento animal. Passamos dias e noites juntos, através de seus textos. Pude compreender um pouco da linguagem dos bichinhos, seus sinais e expressões, que vêm transformando o comportamento dos humanos e fazendo crescer o mercado de produtos e serviços para Pets, objeto do estudo.  Não tive oportunidade de agradecer a ele. Nunca sabemos quando será o último contato, a última chance de dizer o quanto admiramos alguém, quando podemos "curtir" um comentário, um post...
Professor, dedicarei meu trabalho a você. Tão pouco para alguém tão iluminado e generoso. 
Que no seu céu tenha muitos cachorros, gatos, macacos, porquinhos-da-índia e aranhas também.
Um beijo na sua alma...



domingo, 11 de março de 2012

Celular Big Brother

Ainda sobre liberdade e respeito. Sou chata mesmo!
Estive pensando sobre a lei do radinho de pilha. E se ela fosse revista e estendida ao uso de celulares?
Eu seria até mais radical num primeiro momento, tipo lei seca, e proibiria os bônus das operadoras de telefonia móvel, que fazem as cinderelas virarem abóboras à meia-noite, quando os créditos expiram. Ninguém, mas ninguém mesmo merece ouvir o festival de fofocas, futilidades e maledicências  ao voltar para casa à noite, num ônibus cheio. Parece que só acontece comigo, mas quase todos os dias uma criatura cheia de bônus senta perto de mim e começa a falar com outro desocupado, até os infinitos créditos acabarem. E ainda gritando: "Tá cortano! Tá caino! Fala mais alto! Tô no coletivu! Num tô ti ouvino". Nem vou falar sobre os temas das conversas... Afinal, vida alheia é vida alheia e só dá espiadinha quem acompanha os BBB's da vida. Particularmente, estou fora dessa.
E quando tribos diferentes  embarcam no mesmo buzão? A batalha torna-se torturante, um estupro otológico. Lá atrás estudantes juntam os celulares e MP's se revesando para guerrear com a turma mais à frente de outra escola. Cada galera quer impor sua preferência aos demais passageiros, como se quisessem catequizar os "sem som", pobres companheiros de infortúnio, que não possuem os tampões de ouvido como eu. Quando começam os "repentes", aciono meu gatilho de "off" e só vejo as cabeças balançando, numa coreografia digna dos piores pesadelos de hospício.
Será que não temos direito ao silêncio?
Lembra daquele cartaz de hospital com uma enfermeira bonitinha com o dedinho na boca pedindo silêncio? Façamos outdoors, indoors, banners, panfletagem nas esquinas e mala-direta com a imagem. Por que essa mídia? Porque os ouvidos estarão ocupados com a tempestade de ruídos que vão desde a fofoca da cinderela até o som maneiro da moçada.

Santa Surdez

Lembro que desde a minha infância em Sampa existia uma lei que proibia o uso de aparelhos "sonoros" nos coletivos. Nem era difícil obedecer, porque só havia o inofensivo radinho de pilha, colado aos ouvidos dos torcedores de futebol mais fanáticos.
Algumas décadas depois, a mesma lei continua em vigor. Mas o advento de novas tecnologias e a falta generalizada de semancol fez com que hoje eu ande com um par de protetores auriculares na bolsa. Aquelas rolhas de mergulho mesmo! Cheguei a invejar (olha que viagem...) um rapaz surdo que entrou pela porta de frente tentando vender aos passageiros o alfabeto LIBRAS. Enquanto ele sorria, nós outros ouvíamos o 'melô da tarraxinha'  no último volume, oferecido pelo simpático e gente boa motorista DJ. Sim, esse cara legal bem intencionado e sangue bom leva ao desespero auditivo centenas de pessoas que têm o privilégio de embarcar na sua tenda eletrônica. Isso às 08h00 e pagando para ouvir o hit que ele elege como couvert artístico da hora. Para sorte dos passageiros ele é bem eclético, varia o repertório (de gosto discutível...), mas detona sem misericórdia nossos ouvidos a cada manhã.
Como cansei de sofrer no buzum, resolvi meu problema com os tampões, aos quais recorro sem cerimônia. Eles me permitem chegar ao trabalho ainda de bem coma vida. Bem... isso até a hora em que a DJ dos serviços gerais começa a limpar as salas, com seu possante celular no viva-voz no volume máximo. Com aquela cara de "causei" ela desfila com os fones de ouvido pendurados no pescoço, feito estetoscópio, enquanto intoxica com seu repertório clientes internos e externos, que pasmam com a cena bizarra. Detalhe: ela canta junto (e muuuuito mal). Infelizmente no trabalho não posso usar as rolhas auditivas, porque preciso interagir  com as pessoas.
E aqui fica uma reflexão sobre essa falta de noção de liberdade e respeito, que dá para resumir em má educação mesmo. A velha e boa educação doméstica mínima ensinava que meu direito acabava quando começava o do vizinho.
Tenho certeza de que tanto o DJ motorista quanto a adorável auxiliar de serviços gerais não entenderiam que não temos obrigação de compartilhar à força a vontade de eles ouvirem o que consideram música, muito menos seus repertórios, por melhor que fossem.
Enquanto isso, rosqueio meus protetores cor de laranja, com os quais ouço o som dos meus pensamentos, numa santa surdez.