Numa tarde quente,
estava eu na pérgula da piscina de um hotel, deitada na minha espreguiçadeira,
quando aquela aparição fantástica fez meu mundo entrar no modo slow motion: era
ele mesmo, meu mais desejado sonho de consumo humano: Hugh Laurie. Com uma
tolha branca sobre o ombro direito, óculos escuros, corpo sarado e aqueles
cabelos grisalhos curtinhos, seguiu para uma mesa a uns 10 metros de mim. Eu
estava quase sem respirar, quando ele baixou os óculos, olhou na minha direção
e sorriu. O céu se abriu definitivamente quando ele se levantou e caminhou na
minha direção. Era minha fantasia maior tornando-se realidade.
- Você é brasileña?
- Yes, but I speak English.
- No Brasil
tem castanhas do Pará!
Era a única
coisa que ele falava em português, mas pela gracinha, valeu. Conversamos um
pouco, perguntando um ao outro o que fazia naquele local. Ele contou que tinha
vindo para um congresso médico com um amigo.
-
Com Wilson? – perguntei.
Estranhando
minha clarividência, meio desconfiado, meneando a cabeça, confirmando.
Convidou-me então para sairmos e eu mostrar-lhe a cidade. Só então soube que eu
ali estava a convite de uma amiga para o aniversário de seu filho, não podendo
faltar ao compromisso. Perguntou se poderia me acompanhar, para assegurar-se de
que eu não desapareceria, apesar de detestar crianças, para sairmos na
sequencia. Combinamos nos encontrar mais
tarde no lounge do hotel. Ainda no elevador, nosso primeiro beijo.
Inesquecível, surreal. Entrei em meu apartamento ainda sem conseguir pisar no
chão. Que sonho maravilhosos realizado... Nisso, minha filha aparece e pergunta o porquê
de tanta alegria.
- Sabe com
quem eu estava na piscina e com quem eu vou ao aniversário de David? Com ele,
ele mesmo em carne e osso: o Hugh Laurie! Você quer vir conosco?
- Mãe, tá bom.
Não viaja. O Hugh Laurie, é? Aham. Mãe, o que você bebeu no bar da piscina? Me
poupe...
Impressionante
como os jovens costumam acreditar mais em componentes nutricionais e receitas
de embalagem de molho branco que no que a mãe diz. Então...
Desarrumei
todas as roupas, me vesti e desvesti inúmeras vezes, até descer pelo elevador.
Na hora combinada lá estava ele, meu Hugh Laurie, de verdade, ele esmo, pleno e
absoluto. Vestia um blazer, camisa branca com os dois botões superiores
abertos, calça e sapatos pretos. Estava lindo, perfumado como um bosque
encantado, e aqueles olhos azuis que cintilavam no saguão do hotel olhando em
minha direção. Deu-me um beijo no rosto, segurou-me pela mão e seguimos para a
festa. Lá chegando, ele meio deslocado, sem entender aquele barulho musical
estridente, com seu jeito tímido de Sr. Little, seguiu-me nos cumprimentos aos
anfitriões. Nosso flash ao vivo na festa foi rapidíssimo. Nenhuma desculpa mentirosa
seria melhor que a mais pura verdade: eu “tinha” que sair dali com aquele homem maravilhoso e
completamente disponível para mostrar-lhe a cidade.
Ao pôr-do-sol,
saímos na limou que nos aguardava à porta, e em pé, através do teto solar, com
os cabelos batendo no rosto, apresentei a cidade linda e brilhante, onde as
luzes começavam a concorrer com os últimos raios de sol, dando ao céu um divino
tom laranja- azulado, sombreado pelas nuvens que dançavam. Ele se maravilhava
com qualquer nova construção ou ponto turístico que eu apresentasse. Muito
entusiasmados, percorremos toda a cidade, num momento mágico de minha vida, que
nem em sonhos podia imaginar um dia se concretizasse. Estar com Hugh Laurie só
pra mim?! Caminharmos pelas praias descalços à beira mar? Ele tirou os sapatos,
blaser, camisa, dobrou as pernas das calças e eu tirei as sandálias. Deixamos
tudo na limousine e saímos de mãos dadas a molhar os pés, nos abraçar e beijar,
tendo como cenário aquela natureza perfeita. Perdemos a noção do tempo a partir
daí. Borboletas voavam na minha cabeça e gaivotas ao nosso redor. Muita
felicidade vinda de surpresa para uma só mulher.
Quando
finalmente voltamos ao hotel, minha filha me esperava na recepção, sentada sobre
a mala, enfadada e com aquela cara de “Pô, mãe!”. Eu estava coberta de areia,
descalça e descabelada, com a maior cara de feliz. Em seguida Hugh entrou com
as roupas nos ombros, calça dobrada até os joelhos, sapatos nas mãos e disse a
ela: ”Sorry, we are late”. Subimos já atrasadíssimos para organizar nossas
malas e seguir para o aeroporto, onde as naves nos levariam de volta às nossas
vidas. No elevador, nos beijamos longamente, sentindo aquele peito forte ainda
úmido e com cheiro de maresia contra meu corpo. O tempo congelou: o do relógio
que amarrava nossos punhos e o da carne, correntes apertadas que não permitiam
que qualquer segundo nos separasse, num movimento estático em que as roldanas
simplesmente travam. Mas o relógio voltou a contar os minutos...
Ao entrar no
apartamento, não acreditava no que acabara de acontecer e apenas ria e pulava muito.
Todas as minhas coisas ainda estavam jogadas por todo lado, mas não tinha
problema. Estava extremamente feliz, leve e realizada! Enquanto tomava uma
ducha forte, sorria e cantava. À porta do hotel, Wilson andava de um lado para
o outro, olhando para os andares superiores do hotel, com seu paletó no ombro,
como sempre esperando por seu inseparável e louco amigo.